Atribuir Objetivo a Leitura



Dos textos hebraicos preservados, o mais antigo em que se encontra um pensamento sistemático e especulativo - o Sefer Yetzirah, escrito em algum momento do século III - afirma que Deus criou o mundo mediante 22 letras.  O universo, na tradição judaico-cristã, é concebido por essas letras-números. A chave para compreender esta em nossa capacidade de lê-los adequadamente e dominar suas combinações, e assim aprender a dar vida a alguma parte daquele texto colossal, numa imitação de nosso Criador.

Espinosa, em seu Tractatus Theologico-politicus, de 1650 (denunciado pela Igreja Católica Romana como obra forjada no inferno pelo Diabo e  por um judeu renegado), já observara: "Acontece com freqüência que em livros diferentes lemos histórias em si mesmas semelhantes, mas que julgamos de forma muito diferente, segundo as opiniões que formamos sobre os autores”. 

Em um livro, um homem chamado Orlando Furioso costumava montar uma espécie de monstro alado pelos ares, voar sobre qualquer terra que quisesse e matar sem ajuda um vasto número de homens e gigantes e outras fantasias desse tipo, as quais, do ponto de vista da razão, são obviamente absurdas. Em outra história, Ovídio, sobre Perseu, e também no livro dos Juízes e Reis, sobre Sansão, que sozinho e desarmado matou milhares de homens, e sobre Elias, que voou pelo ar e foi finalmente ao céu, num carro de fogo com cavalos ígneos, vemos que  essas histórias são obviamente parecidas, mas julgamo-las de modo muito diferente. A primeira buscava divertir, a segunda tinha um objetivo político, a terceira, um motivo religioso". 

Atribuir objetivos aos livros faz parte do senso comum.